Cortiça: um material versátil

Das belas planícies do Sul de Portugal até à rolha que protege o vinho, a cortiça tem um longo caminho a percorrer. Não se esqueça, no entanto, que a cortiça pode (e deve) servir para muito mais do que uma simples rolha.

O que é a cortiça?

A cortiça é a camada exterior da casca do sobreiro (Quercus suber), uma árvore perene (as folhas não caem no inverno) de tamanho médio. Estas árvores podem viver mais de 200 anos e são descortiçadas regularmente, em cada período de 9 a 12 anos. Quem já passou por uma paisagem com sobreiros, terá certamente reparado num número que está pintado no tronco. Esse número é o algarismo final do ano em que foi feito o último descortiçamento, e serve de orientação para se saber quando é que a cortiça deverá ser retirada novamente.

Um sobreiro demora de cerca de 25 anos para atingir a maturidade e ser descortiçado pela primeira vez. E a cortiça retirada de sobreiros mais antigos, normalmente, é mais valiosa.

Pranchas de cortiça extraídas do sobreiro

Pranchas de cortiça extraídas do sobreiro.

Como material, a cortiça foi descrita pela primeira vez em 1665 pelo cientista Robert Hooke, como uma estrutura celular hexagonal rica numa substância chamada suberina, que lhe confere uma textura flexível e propriedades impermeáveis.

Com 40 milhões de rolhas produzidas diariamente e mais de 680 empresas no sector, Portugal é o maior produtor de cortiça do mundo e o país com mais área de montado. O montado é a expressão portuguesa para uma floresta povoada de sobreiros (ou outras espécies, como a azinheira), com intervenção humana, para melhor aproveitamento do território. Muitas vezes é local de pastagem. A vida animal encontra nestes locais um ecossistema propício ao seu desenvolvimento harmonioso.

rolhas de cortiça

A cortiça e os seus usos variados

A cortiça pode ser usada na indústria têxtil, sendo cada vez mais comum ver acessórios e peças de moda feitas à base de cortiça. Malas, carteiras, chapéus, roupa ou bijuteria, são apenas alguns exemplos. O limite está na imaginação dos designers e na capacidade das indústrias. É possível também encontrar mobiliário feito de cortiça, que serve como um ótimo substituto do plástico.

Mas os atributos principais da cortiça são aqueles que não conseguimos ver, como as propriedades de isolamento térmico. Por ser impermeável, a cortiça é muito usada para vedar infraestruturas e fundações. É também um isolante acústico para chão, paredes, tetos, telhados e até fachadas de edifícios!

Sabia que a cortiça é usada na construção de foguetões espaciais? O cone ou os propulsores de um veículo espacial são normalmente forrados com uma camada fina de cortiça que evita que uma missão acabe de forma trágica, consumida em chamas.

 

Benefícios ambientais da cortiça

A cortiça não é apenas um material versátil e útil: tem também um grande valor ambiental.

  • A cortiça é 100% biodegradável, reciclável e renovável.
  • A sua produção é feita manualmente, por descortiçadores talentosos, que separam cuidadosamente a casca do tronco através de um processo ancestral executado em seis etapas.
  • O processo de retirar a cortiça não implica o corte ou o abate de árvores, já que o sobreiro tem uma capacidade de auto-regeneração raramente vista noutras espécies.
Lince ibérico no seu habitat

De facto, este é um dos casos em que a intervenção humana é benéfica para o ambiente. Ao remover a casca do sobreiro, está-se a estimular a absorção de dióxido de carbono – quanto mais é descortiçada, mais a árvore absorve através da cortiça em crescimento. Estima-se que os montados de sobro sejam responsáveis pela absorção de cerca de 10 milhões de toneladas de CO2 anualmente.

Adicionalmente, os montados são importantes para a preservação da biodiversidade, já que constituem um habitat importante para certas espécies ameaçadas, como é o caso do Lince Ibérico.

Proteger os montados: uma missão

Sabia que a maior área de montado do mundo pode ser encontrada ao longo das bacias dos rios Tejo e Sado? E que se estende por mais de meio milhão de hectares? No entanto, este território encontra-se ameaçado devido a riscos de poluição aquífera e sobre-exploração.

Com o propósito de promover a conservação desta área de 600 mil hectares, a associação World Wildlife Fund (WWF) criou o projeto Green Heart of Cork, que apoia práticas agrícolas sustentáveis.

O objetivo principal é o de assegurar a viabilidade económica e sustentabilidade da produção de cortiça, mas também contribuir para a proteção da biodiversidade dos ecossistemas associados.

Sobreiros descortiçados

Sobreiros (Quercus suber) descortiçados.

Pela defesa da biodiversidade, o Grupo Jerónimo Martins suporta esta causa desde 2013. Através de doações monetárias a pequenos produtores de cortiça que promovem as melhores práticas ambientais, foi possível garantir a certificação FSC® em mais de 30 mil hectares de montado, incluindo uma área de Alto Valor de Conservação de 1.257 hectares, próxima das bacias do Tejo e do Sado.