Pandemia, poluição e efeito de estufa: um triângulo traiçoeiro

Poucos meses após o início da pandemia de Covid-19, multiplicaram-se as notícias sobre a descida acentuada dos níveis de poluição a nível mundial. Muitas cidades pelo mundo fora registavam os níveis mais baixos em vários anos.

A esperança de que o aquecimento global abrandasse era muita. Quem não se lembra de ver animais selvagens a passearem em avenidas, rios mais limpos e com águas cristalinas, céus mais azuis e nuvens mais brancas?

Em 2020, com países inteiros em estado de emergência, as pessoas ficaram em isolamento, as fábricas e as indústrias fecharam, houve menos veículos em circulação e os aviões estiveram parados durante semanas. Com a atividade económica a travar de forma muito brusca, os níveis de poluição e as emissões de gases com efeito de estufa diminuíram drasticamente.

De acordo com o estudo 2020 World Air Quality Report da IQAir, 84% dos países viram melhorias significativas na qualidade do ar. A NASA refere ainda que as restrições reduziram o nível de concentração de dióxido de azoto na atmosfera em quase 20% a nível global.

Sabia que 2020 foi um dos anos mais quentes de sempre? Na Europa, 2020 acabou por ser o ano mais quente desde que há registos. A nível mundial, 2020 igualou o recorde de 2016.

No entanto, a melhoria nas emissões de gases com efeito de estufa foi temporária. Assim que as restrições foram levantadas, a poluição voltou a aumentar. Equipamentos de proteção individual descartáveis, como máscaras ou luvas, começaram a aparecer nas ruas e no mar. A qualidade do ar também caiu novamente. E o clima global continuou a aquecer, mesmo com a descida temporária das emissões de gases de estufa.

Atenção às diferenças

A poluição atmosférica diz respeito à presença de dióxido de azoto, partículas ou ozono troposférico no ar que respiramos, por exemplo, e podem causar problemas respiratórios. Está normalmente associada à queima de combustíveis fósseis por carros, camiões, aviões, barcos, etc. Já os gases com efeito de estufa, como o dióxido de carbono, também estão associados à queima de combustíveis fósseis, mas não são tecnicamente considerados poluentes atmosféricos – a não ser num caso extremo, em que há tanto, mas tanto CO2 no ar, que deixa de ser possível respirar.

O aquecimento global não entrou em confinamento

A temperatura média no planeta em 2020 foi, em média, cerca de 1,2 °C mais alta do que na era pré-industrial (1850-1900). Segundo o relatório The State of the Global Climate 2020 da Organização Mundial de Meteorologia (WMO), o primeiro ano de pandemia tornou-se um dos três mais quentes de que há registo, juntamente com 2016 e 2019.

Glaciares da Gronelândia

As águas mais quentes dos oceanos estão a acelerar o ritmo a que os glaciares da Gronelândia (e de outros locais do planeta) derretem ou se soltam e formam icebergs. Isto acelera a degradação do Manto de Gelo da Gronelândia.

Porque é que o aquecimento global não abrandou?

Se a emissão de gases com efeito de estufa causa o aquecimento global, porque é que a redução nas emissões não travou o aumento da temperatura?

A resposta é relativamente simples: a diminuição das emissões de gases com efeito de estufa não tem um efeito imediato no clima global porque existem quantidades imensas de dióxido de carbono na atmosfera, que se foram acumulando à medida que o tempo foi passando e as agressões ao planeta se foram repetindo.

Segundo a Organização Meteorológica Mundial, apenas quando as emissões líquidas de dióxido de carbono provenientes de combustíveis fósseis forem zero é que os oceanos e os outros ecossistemas terrestres terão capacidade para absorver CO2 suficiente para inverter esta tendência.

O que significam “emissões líquidas”?

Atingir emissões líquidas zero é equilibrar a balança entre os gases poluentes que são emitidos com a atividade económica e aquilo que se faz para compensar essas emissões, criando condições para que a mesma quantidade de gases emitidos seja capturada da atmosfera. Exemplos de alternativas possíveis são os investimentos em projetos de reflorestação ou os apoios a iniciativas de neutralidade carbónica junto de países em desenvolvimento. A aquisição de energia elétrica produzida a partir de fontes renováveis é também uma possibilidade.

Ainda é possível alcançar o objetivo do Acordo de Paris

Para ajudar a travar este problema, será necessário repensar a forma como as sociedades estão organizadas e dar passos importantes para reinventar alguns sectores de atividade, como a produção alimentar, a energia ou as infraestruturas. O objetivo? Limitar o aumento da temperatura global a 1,5 graus Celsius em relação aos valores pré-industriais, conforme definido no Acordo de Paris.

Durante o pico da pandemia, foi possível reduzir as emissões de carbono a nível global temporariamente. O passo que falta dar é tornar esta diminuição uma tendência permanente.

Há pequenas mudanças no estilo de vida, no que comemos, no que vestimos, e em muitas outras ações que podem ter um impacto real no ambiente e no clima global.

 

O que cada um pode fazer para travar o aquecimento global

Não chega dizer que são os governos que têm de se entender no combate ao aquecimento global.

Há uma série de atitudes individuais que podem fazer a diferença. E tudo pode começar simplesmente na mudança de alguns hábitos diários: